terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Lamento de Calipso

tim buckley | once i was

and though you have forgotten
all of our rubbish dreams
i find myself searching
through the ashes of our ruins
all the days when we smiled
and the hours i ran wild
with the magic of our eyes
and the silence of our words

Primeiro foi o bule,
de seguida foi a asa.
Que mais irás quebrar.

Não sei o que fazer com o teu sim,
o teu não, o teu
passa-me o açúcar.

A distância dos teus olhos não a sei
abreviar, o latido dos teus sonhos
não me deixa adormecer.

Gostava de te amar um pouco menos,
de voltar ao meu rebanho
de feridas e sopores,
regressar ao rijo barro dos Domingos
em que não te conhecia,
ao supor de suas tardes

Quando ainda não sabia
Da dureza do cimento, nem dos modos
De quebrar e ser quebrado.

José Miguel Silva

domingo, 11 de janeiro de 2015

Este ódio ao mundo que é amor eterno

leonard cohen | suzanne

É sempre no meu sempre aquele nunca
é sempre nesse nunca aquele agora
é sempre nesse agora aquele nada

no mesmo nada encontro sempre tudo
mesmo se o mundo é nada sempre assim
mesmo se assim tudo me desperta

e eu me desperto a adormecer no fim
de cada dia de trabalho errado
em cada hora de um amor mal feito

e digo mesmo se este mundo vale
a expectativa de querer ser sempre
aquela esp’rança onde o bem e o mal

se aliam sempre para quem conserva
o sonho ou a fúria de não estar sonhando
mas novamente dói a dor no peito

e dói no corpo o que nos vai passando
mágoas ou risos ou o grito dado
e logo atirado para um vale escuro

onde não oiçamos a revolta infinda
de vivermos os dias nesta escura selva
a que nem Dante chamou talvez de vida

a que chamamos coisa e porém amamos
sempre este querer de violência tanta
e esta crença de que o canto estale

e o dia venha porque nós lutamos
para além das forças que supomos nossas
para além dos sonhos que já não esperamos

para além do verso e do corpo gasto
sempre este homem que se vai cansando
sempre estes ossos em que equilibramos

esta carne frágil este dia vasto
esta vida feita no que é morte nela
este amor sujeito ao que é sempre efémero

este ódio ao mundo que é amor eterno

António Carlos Cortez